JESUÍTAS NO BRASIL - PRIMEIROS TEMPOS

Companhia de Jesus

A “Societatis Jesu”, a Companhia de Jesus, foi criada em 27 de setembro de 1540, pela bula papal “Regimini Melitontis ecclesiae”. Contava ela, inicialmente, com apenas dez homens (dos quais dois seriam mais tarde canonizados: Inácio de Loiola e Francisco Xavier), que se punham à total disposição do papa para qualquer missão que o sumo pontífice ordenasse e que se uniam pelo voto de pobreza, castidade e obediência. A Companhia tinha o nome tirado da organização militar, e pretendia ser uma máquina de guerra contra o luteranismo e o calvinismo. Seu principal objetivo era a catequese. Já em seu primeiro ano de existência os jesuítas haviam se arranjado com os monarcas de Portugal e Espanha, colocando-se como pregadores (muitos dos primeiros jesuítas, entre eles o primeiro “preposto geral”, Inácio de Loiola, eram espanhóis) e dispersando-se pelo mundo: Japão, Filipinas, Brasil, América espanhola. Logo a catequese e a reforma – a Companhia pretendia-se, como os próprios hereges luteranos que combatia, ser uma reformadora da Igreja Católica – era feita seguindo uma tática que marcou os jesuítas ao longo dos séculos: influenciar os jovens através do ensino e, através deles, seus pais.

Jesuítas no Brasil

No Brasil, logo se viu o empenho que marcava a atuação da Companhia de Jesus em todo o mundo. Os jesuítas se instalaram em várias capitanias – Bahia, Porto Seguro, Pernambuco e São Vicente – e circulavam por toda parte. Eles se destacaram não só pelo ardor catequético, como pela moral rígida, obediência aos superiores, e constantes conflitos com os colonos pelo direito de comandar as relações com os índios. Tampouco se davam bem com outros padres. Estes, distantes de seus superiores, e incapazes de resistir ao assédio das nativas, entregavam-se à dissipação e pouco faziam para cristianizar os aborígines.

A proteção jesuítica aos indígenas implicava fixá-los em torno das igrejas e dos colégios. Tais "aldeamentos"  – os primeiros foram estabelecidos em Salvador – abrigavam dezenas de milhares de índios e, a despeito dos grandes sacrifícios que exigiam, acabaram sendo “escolhidos” por muitas nações indígenas.

Com poucos meses no Brasil, os jesuítas criaram inúmeras organizações, colégios para os filhos da terra, igrejas, “casas de meninos” (orfanatos). Para tal, contavam com benesses reais e possuíam terras, escravos (africanos), vacas, canaviais e ovelhas. Aprenderam as línguas dos nativos e  compilaram gramáticas e glossários. Numa época em que o latim era a língua do culto católico, eram uma verdadeira revolução os hinos, cânticos e orações em “língua geral”, a língua por eles sistematizada e que acabou sendo, até o século XVIII, a principal forma de comunicação no sul da Colônia, onde na prática o português era desconhecido.

Educação jesuítica dos índios

Em troca da proteção dos jesuítas contra a escravidão, os índios tinham de abandonar certas práticas consideradas inaceitáveis pelos padres. Nos aldeamentos, o único casamento permitido era o cristão, com uma única mulher e para o resto da vida. Além disso, eram submetidos a uma rígida disciplina de trabalho, que não levava em conta suas tradições. Os homens, antes educados para a guerra e a vida no mato, transformavam-se em agricultores sedentários. Além de perderem o sentido da aventura da vida, eram obrigados a realizar o cultivo das terras, tarefa que a tradição tupi reservava às mulheres. Estas, por sua vez, deixavam de desempenhar as importantes funções que lhes cabiam na tradicional sociedade indígena. Por tudo isso, a vida nos aldeamentos costumava ser encarada pelos índios como uma saída provisória. Quando surgiam possibilidades melhores, muitas vezes apresentadas pelos próprios colonos, não eram poucos os que preferiam fugir, a fim de participar de expedições guerreiras e de longas entradas.

João Ramalho e os jesuítas

A presença de João Ramalho fora tão conveniente para Martim Afonso, propiciando-lhe paz e mão-de-obra, que o capitão-mor do planalto logo se transformou no grande inimigo dos jesuítas em S. Vicente, devido aos seus inúmeros filhos de incontáveis mulheres. No início, ambas as partes tentaram se entender, mas a trégua durou pouco. Um era aculturado demais e os outros, rígidos demais: o português indianizado recusava-se a abandonar seu modo de vida, e os jesuítas, por sua vez, não recuavam em suas normas: chegaram a expulsar Bartira, principal mulher de Ramalho, da igreja, sem se importar com as graves conseqüências do gesto, que atraiu a animosidade da imensa prole de João Ramalho. Desta, diziam os jesuítas: “não cessam nunca de esforçar-se, juntamente com seu pai, por lançar a terra a obra que procuramos edificar com a ajuda de Deus, pois exortam repetida e criminosamente os catecúmenos a apartarem-se de nós e a crerem neles, que usam arco e frechas como os índios, e a não se fiarem em nós, que fomos mandados para aqui por causa de nossa maldade.” Era um choque de civilizações de desfecho inevitável. João Ramalho, como Caramuru e tantos outros, eram o que se chamou de “obnubilados”, “turgimões”, “línguas”, homens brancos que a tal ponto se fascinaram pela cultura e natureza brasílica que aderiram ao modo de vida nativo. Imprescindíveis nos contatos iniciais, tiveram de ceder – com resistência ou de boa vontade, relutantes ou desejosos –  às sucessivas imposições da civilização ocidental que aqui se ia fazendo e que se chamava, simplesmente, colonização.

Texto de Jorge Caldeira, Sergio Goes de Paula, Cláudio Marcondes e Flávio de Carvalho em "Viagem pela História do Brasil", Companhia das Letras, 1997, excertos pp 6-9, seção Almanaque. Adaptado e ilustrado para ser postado por Leopoldo Costa.


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