"PATA NEGRA" - O MAIS NOBRE DOS PRESUNTOS.
Cuidados adotados desde a criação dos porcos à maturação das peças fazem do pata negra um presente ao paladar. O corte das fatias e a escolha dos acompanhamentos também devem seguir a receita do tratamento especial.
A primeira impressão que se tem diante de um presunto "pata negra" é a de que ele será servido a algum bárbaro. Aquela grande perna de porco acomodada em uma peça de madeira leva a imaginação aos remotos tempos em que homens gigantes e musculosos a saboreavam segurando com as mãos, rasgando a carne com os dentes.
Fantasias à parte, o jamón, embora tenha aparência rústica, é um produto sofisticado e apreciado há tempos pelos espanhóis. Tudo é levado em conta no processo de produção, desde o tipo de porco até o tempo de maturação do presunto, que pode chegar a 42 meses. Tanta peculiaridade faz com que o valor do alimento seja bem salgado, aproximadamente R$ 350 o quilo.
O nome "pata negra", segundo Ricardo Rojas, é comercial. O presunto recebe essa denominação porque os porcos, de tanto pisarem nas castanhas que consomem, acabam com os pés pretos. O nome oficial é jamón ibérico, pois é originado de suínos que só se reproduzem na região ibérica. “Esses animais precisam de grandes pastagens para o desenvolvimento ideal”, explica o especialista espanhol. Rojas está no Brasil para ministrar palestras durante o 3º Festival Internacional de Cinema e Alimentação – Slow Filme, em Pirenópolis, Goiás.
Os animais são criados na região da Extremadura, no sudoeste da Espanha, e também na Andaluzia, na Castela e no Leão. O porco ibérico fica livre e se alimenta de bolota de sobreiro desde os 10 meses. As bolotas são frutos dos azinheiros, árvore de onde também é extraída a cortiça. Para que os ossos dos animais sejam desenvolvidos equilibradamente, os criadores alimentam os bichos com pastos de qualidade, altamente selecionados. O cuidado com a alimentação dos porcos deve ser encarado com grande importância, pois é ela que define o sabor da carne.
De acordo com Rojas, a produção do presunto é a mesma há mais de 200 anos. Ele conta que o pernil traseiro é separado e limpo para que sejam retirados as veias e os tendões. O tempero é de sal marinho e fica no pernil por cerca de 24h. Aliás, a quantidade de sal – 30% menos que os outros presuntos curados – é um dos diferenciais do jamón ibérico. Há produtores que enriquecem o alimento com especiarias, o que, para os puristas espanhóis, tira o sabor característico da peça.
O excesso de sal é retirado e o presunto vai para a secagem natural, uma espécie de cura em câmara a 15ºC, ficando ali entre 18 e 42 meses. “O ar vai curando o presunto lentamente e acentuando seu sabor”, ilustra. Para Rojas, a maior diferença do presunto pata negra para os outros presuntos é o sabor. “É difícil explicar as sensações ao provar um jamón ibérico de bellota, mas posso igualar com a promovida pelo caviar e pela trufa branca”, descreve. Existem três qualidades do presunto. O ibérico de cebo, em que o porco é criado em campo e come pasto; o ibérico de bellota, que só come bolotas; e o presunto ibérico, em que o porco se alimenta de bolotas só três meses por ano.
Degustação
Para apreciar todos os sabores, Rojas ressalta que é preciso saber cortar o jamón corretamente. “As fatias têm que ser finas, de aproximadamente 4cm e no máximo 4g”, ensina. O corte deve ser transversal, paralelo ao osso. Segundo ele, dessa forma, a gordura se desgarra e, quando entra em contato com o paladar, libera seus sabores com máxima expressão.
Uma vez cortado, esse presunto pode ser saboreado de diversas formas. A chef Maria Jesús conta que, na Espanha, é comum consumi-lo com melão ou pão torrado com alho e tomates. “No preparo de um medalhão, o bacon pode ser trocado por ele”, sugere. Contudo, ela acha melhor saboreá-lo ao natural. “Como é muito caro, não é aconselhável misturá-lo. Dessa forma, o sabor não será apreciado por completo”, acredita. Rojas concorda e indica utilizá-lo como acompanhamento. “Com os ossos, podemos fazer maravilhosos caldos e cozidos”, diz.
A simplicidade pode ser apreciada no restaurante Oliver, em que o presunto é servido com pães com azeite e molho de tomate com manjericão fresco. A harmonização também é simples. A chef Maria Jesús escolhe sempre um vinho tinto, mas concorda que o ingrediente pode ser acompanhado com cerveja. “O que não fica bom com cerveja?”, brinca.
Rojas considera que o vinho endémico de Montilla-Moriles de Córdoba (região da Andaluzia) e o vinho manzanilla de Sevilla, o Huelva, da mesma região, são perfeitos acompanhamentos. “Mas podemos harmonizá-lo também com champagne ou com um tinto”, diz. Além da pata negra, são preparados uma série de embutidos com o restante do porco. O chorizo é feito a partir da carne do animal retalhada e temperada com sal, ervas, alho e páprica. Alguns levam pimenta-do-reino ou vinho. O lombo resulta em um presunto curado bem mais magro. Para curá-lo, os produtores o envolvem na pele ou numa capa de gordura, deixando ali por no máximo três meses. Típico da Catalunha, o fuet – um embutido de carne processada e embalada numa tripa natural – é feito com pimenta e sal.
Texto de Rebeca Ramos publicado no "Jornal do Commércio", edição de final de semana 14 a 16 de setembro de 2012. Adaptado e ilustrado para ser postado por Leopoldo Costa.
A primeira impressão que se tem diante de um presunto "pata negra" é a de que ele será servido a algum bárbaro. Aquela grande perna de porco acomodada em uma peça de madeira leva a imaginação aos remotos tempos em que homens gigantes e musculosos a saboreavam segurando com as mãos, rasgando a carne com os dentes.
Fantasias à parte, o jamón, embora tenha aparência rústica, é um produto sofisticado e apreciado há tempos pelos espanhóis. Tudo é levado em conta no processo de produção, desde o tipo de porco até o tempo de maturação do presunto, que pode chegar a 42 meses. Tanta peculiaridade faz com que o valor do alimento seja bem salgado, aproximadamente R$ 350 o quilo.
O nome "pata negra", segundo Ricardo Rojas, é comercial. O presunto recebe essa denominação porque os porcos, de tanto pisarem nas castanhas que consomem, acabam com os pés pretos. O nome oficial é jamón ibérico, pois é originado de suínos que só se reproduzem na região ibérica. “Esses animais precisam de grandes pastagens para o desenvolvimento ideal”, explica o especialista espanhol. Rojas está no Brasil para ministrar palestras durante o 3º Festival Internacional de Cinema e Alimentação – Slow Filme, em Pirenópolis, Goiás.
Os animais são criados na região da Extremadura, no sudoeste da Espanha, e também na Andaluzia, na Castela e no Leão. O porco ibérico fica livre e se alimenta de bolota de sobreiro desde os 10 meses. As bolotas são frutos dos azinheiros, árvore de onde também é extraída a cortiça. Para que os ossos dos animais sejam desenvolvidos equilibradamente, os criadores alimentam os bichos com pastos de qualidade, altamente selecionados. O cuidado com a alimentação dos porcos deve ser encarado com grande importância, pois é ela que define o sabor da carne.
De acordo com Rojas, a produção do presunto é a mesma há mais de 200 anos. Ele conta que o pernil traseiro é separado e limpo para que sejam retirados as veias e os tendões. O tempero é de sal marinho e fica no pernil por cerca de 24h. Aliás, a quantidade de sal – 30% menos que os outros presuntos curados – é um dos diferenciais do jamón ibérico. Há produtores que enriquecem o alimento com especiarias, o que, para os puristas espanhóis, tira o sabor característico da peça.
O excesso de sal é retirado e o presunto vai para a secagem natural, uma espécie de cura em câmara a 15ºC, ficando ali entre 18 e 42 meses. “O ar vai curando o presunto lentamente e acentuando seu sabor”, ilustra. Para Rojas, a maior diferença do presunto pata negra para os outros presuntos é o sabor. “É difícil explicar as sensações ao provar um jamón ibérico de bellota, mas posso igualar com a promovida pelo caviar e pela trufa branca”, descreve. Existem três qualidades do presunto. O ibérico de cebo, em que o porco é criado em campo e come pasto; o ibérico de bellota, que só come bolotas; e o presunto ibérico, em que o porco se alimenta de bolotas só três meses por ano.
Degustação
Para apreciar todos os sabores, Rojas ressalta que é preciso saber cortar o jamón corretamente. “As fatias têm que ser finas, de aproximadamente 4cm e no máximo 4g”, ensina. O corte deve ser transversal, paralelo ao osso. Segundo ele, dessa forma, a gordura se desgarra e, quando entra em contato com o paladar, libera seus sabores com máxima expressão.
Uma vez cortado, esse presunto pode ser saboreado de diversas formas. A chef Maria Jesús conta que, na Espanha, é comum consumi-lo com melão ou pão torrado com alho e tomates. “No preparo de um medalhão, o bacon pode ser trocado por ele”, sugere. Contudo, ela acha melhor saboreá-lo ao natural. “Como é muito caro, não é aconselhável misturá-lo. Dessa forma, o sabor não será apreciado por completo”, acredita. Rojas concorda e indica utilizá-lo como acompanhamento. “Com os ossos, podemos fazer maravilhosos caldos e cozidos”, diz.
A simplicidade pode ser apreciada no restaurante Oliver, em que o presunto é servido com pães com azeite e molho de tomate com manjericão fresco. A harmonização também é simples. A chef Maria Jesús escolhe sempre um vinho tinto, mas concorda que o ingrediente pode ser acompanhado com cerveja. “O que não fica bom com cerveja?”, brinca.
Rojas considera que o vinho endémico de Montilla-Moriles de Córdoba (região da Andaluzia) e o vinho manzanilla de Sevilla, o Huelva, da mesma região, são perfeitos acompanhamentos. “Mas podemos harmonizá-lo também com champagne ou com um tinto”, diz. Além da pata negra, são preparados uma série de embutidos com o restante do porco. O chorizo é feito a partir da carne do animal retalhada e temperada com sal, ervas, alho e páprica. Alguns levam pimenta-do-reino ou vinho. O lombo resulta em um presunto curado bem mais magro. Para curá-lo, os produtores o envolvem na pele ou numa capa de gordura, deixando ali por no máximo três meses. Típico da Catalunha, o fuet – um embutido de carne processada e embalada numa tripa natural – é feito com pimenta e sal.
Texto de Rebeca Ramos publicado no "Jornal do Commércio", edição de final de semana 14 a 16 de setembro de 2012. Adaptado e ilustrado para ser postado por Leopoldo Costa.
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