RESSUSCITARAM O COQUETEL DE CAMARÃO


Absolvido da acusação de ter virado prato brega, o coquetel de camarão voltou a ser preparado em alguns restaurantes do mundo, inclusive de São Paulo. Não repetirá o mesmo sucesso do passado, até porque constitui uma bomba de calorias (cerca de mil em cada porção) e está na contramão da comida saudável. Entretanto, muitas pessoas se divertem ao saboreá-lo. Cultuam sua imagem antiga e o sucesso que fez nas décadas de 1950, 60 e 70. A ressurreição do coquetel de camarão se deve à revalorização da cultura retrô.
A receita original levava camarão cozido em água ou no vapor e molho golf (maionese, ketchup, molho inglês, conhaque, suco de limão, sal e pimenta). Era preparada da Europa à América e dava um toque de requinte às mesas. Na Inglaterra, transformou-se na entrada mais popular dos anos 1960. Em São Paulo, atraía clientes aos restaurantes Cabana e Parreirinha, no centro. Na verdade, o coquetel de camarão jamais foi esquecido. Restaurantes tradicionais, como o La Tambouille, sempre o prepararam a pedido de clientes.
Mas a taça de cristal para servi-lo, colocada sobre outra cheia de gelo, às vezes com o fundo azulado para sugerir o frescor do mar, quase saiu de cena. Hoje, é fabricada pela Cristallerie Strauss, de Blumenau, em Santa Catarina.
Parceiro dos crustáceos e peixes, o molho golf tem origem incerta. O chef Laurent Suaudeau, de São Paulo, acha que descende do gloucester (maionese, creme azedo ou de leite, suco de limão, erva-doce picada e molho inglês), que tem ascendência britânica e acompanha carnes frias. Enfim, o molho golf pertence à mesma família do anglaise, cambridge, rémoulade, suédoise, tartare, vert, gold ou américaine. O ingrediente que os une é a maionese. Os argentinos não vão gostar disso.

Julgam-se os inventores da receita. Defendem esse primado com a mesma veemência usada para sustentar que seu país foi o berço do doce de leite, de Carlos Gardel e da caneta esferográfica.
Garantem que a salsa golf,como dizem, foi criada por Luis Federico Leloir, Prêmio Nobel de Química de 1970, um argentino nascido por acaso em Paris – a mãe se encontrava na França acompanhando o marido em tratamento médico. No final da década de 1920, o médico e bioquímico estava com amigos em um clube de golfe de Mar del Plata, a 404 quilômetros de Buenos Aires. Serviam-lhe diariamente o mesmo prato de camarões. Cansado da comida invariável, Leloir teria pedido ao garçom que trouxesse maionese,ketchup,molho inglês, suco de limão, sal e pimenta. Misturou e surgiu a receita.
Há variações antigas e novas do coquetel de camarão pelo mundo a fora. Na Inglaterra,o chef Gordon Ramsay o relançou há pouco em um dos seus programas de televisão,com modificações importantes no molho golf, lá denominado marie rose sauce. Ele substituiu o ketchup por tomate fresco e acrescentou creme de abacate temperado com limão. Já os americanos, que o denominam shrimps cocktail e chamam o molho golf de fry sauce, creditam sua autoria à cadeia Arctic Circle, fundada no Estado de Utah. Apontam inclusive o ano da suposta invenção: 1948. Portanto, é impossível concluir em que país nasceu o coquetel de camarão. Que os argentinos, ingleses e americanos se entendam!

Texto de Dias Lopes publicado na sua coluna "O Melhor de Tudo", no suplemento "Paladar" de "O Estado de S. Paulo", edição de 27 de setembro de 2012, com o título de "Ressuscitaram o camarão". Adaptado e ilustrado para ser postado por Leopoldo Costa.

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