AMAZÔNIA DO SÉCULO XVIII


Após entrar para a Companhia de Jesus, o missionário jesuíta português João Daniel (Viseu, 1722 – São Julião da Barra, 1776) viajou para o Maranhão e o Pará, e viveria na região entre 1741 e 1757. Com a dissolução da ordem no Brasil, por determinação do marquês de Pombal, padre João Daniel foi desterrado para o Reino e preso em Lisboa. Na prisão, onde ficou durante 18 anos, até a morte, escreveu 'O Tesouro Descoberto no Máximo Rio Amazonas', que  depois de mais de dois séculos recebeu a primeira edição pela Contraponto Editora em associação com a Prefeitura da Cidade de Belém . Nos manuscritos que deram origem ao livro, padre João Daniel reuniu, de forma ordenada, todo o conhecimento dos setecentos sobre a Amazônia. Com precisão, colocou no papel todos os dados coligidos sobre a geografia e a história amazonenses, a flora e a fauna, o desprezo dos indígenas pelas riquezas e seu hábito de comer carne humana, as viagens dos sertanejos e os engenhos de açúcar. Enfim, o mais completo corpo de informações disponível no século XVIII.
Em 1808, o príncipe dom João, ao transferir a corte para o Rio de Janeiro, trouxe na bagagem as cinco primeiras partes manuscritas do Tesouro descoberto, temeroso de que fossem expropriadas pelas tropas napoleônicas que invadiam Portugal, acostumadas com essa prática desde a expedição ao Egito. Dois anos depois, os manuscritos foram depositados na Biblioteca Nacional, no Rio de Janeiro. Em 1820, foram localizados pelo bispo José Joaquim de Azeredo Coutinho, que providenciou a primeira edição da obra, embora parcial, com apenas as primeiras cinco partes. A sexta e última parte, dividida em duas, entretanto, só seria descoberta na Biblioteca de Évora.
A versão definitiva do manuscrito do padre João Daniel, incluindo a sexta parte, encontrada em Évora, seria estabelecida apenas em 1976, pela Biblioteca Nacional. Com apresentação do historiador Vicente Salles, a Contraponto lança essa versão de 1976 em dois volumes – o primeiro contém as três primeiras partes; o segundo, as demais.
Francisco Adolfo de Varnhagen, visconde de Porto Seguro, considerado o pai da História do Brasil, em 1840 organizou a publicação da segunda parte. A sexta parte, de Évora, seria lançada em 1878, patrocinada pelo Instituto Histórico e Geográfico do Brasil (IHGB), na época preocupado com o estabelecimento de uma “identidade brasileira”
Hoje, pode-se dizer que historiadores exponenciais como José Honório Rodrigues (1913-1987) e o português Serafim Leite (1890-1969) não exageraram na avaliação de O tesouro descoberto. Rodrigues, autor de 'Teoria da História do Brasil', afirmou que “o texto de João Daniel é a mais importante fonte para o estudo da Amazônia no século XVIII. (...) Seu poder de descrição geográfica, natural e etnográfica é imenso e preciso. (...) É uma obra enciclopédica, um tratado, um tesouro sobre todo o Amazonas, tudo o que sobre ele se sabia e como se devia aproveitá-lo.” Serafim Leite, autor da monumental História da Companhia de Jesus no Brasil, foi capaz de flagar a importância do trabalho do padre João Daniel para os estudos sobre agricultura, num país onde esse conhecimento era vital. É notável, em particular, a sagacidade e instrução que João Daniel dá para a agricultura amazônica, (...) verdadeiro tratado de economia agrícola, bem superior às idéias do seu tempo, com referências à hidráulica aplicada, à indústria e à utilização dos ventos, afirma Leite em sua obra magna. Além disso, – conclui – suas indicações locais, geográficas e históricas, constituem fontes genuínas para a história geral do grande rio.
Para os historiadores, o trabalho de Daniel é conhecido e valorizado. Agora, está à disposição de todos os interessados em assuntos ligados ao passado brasileiro, leigos e especialistas, estudantes e professores.

Publicado na revista 'História Viva'. Adaptado e ilustrado para ser postado por Leopoldo Costa.

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