O BRASIL ENTRE 1900 E 1910

Leopoldo Costa

Introdução

Com a proclamação da República em 15 de novembro de 1889, Deodoro da Fonseca foi escolhido presidente pelo Congresso. Seu sucessor foi Floriano Peixoto. Prudente de Morais foi o primeiro presidente eleito pelo povo com 276.583 votos e governou até 15 de novembro de 1898.

Na década tivemos cinco presidentes todos eleitos pelo voto direto e na plena normalidade democrática, apesar de alguns problemas políticos. Nilo Peçanha que sucedeu Afonso Pena após a sua morte em exercício do cargo, era vice presidente eleito e completou o seu mandato:
·        Campos Sales            15/11/1898 a 15/11/1902
·        Rodrigues Alves         15/11/1902 a 15/11/1906
·        Afonso Pena              15/11/1906 a 14/06/1909
·        Nilo Peçanha              14/06/1909 a 15/11/1910
·        Hermes da Fonseca   15/11/1910 a 15/11/1914

Em 1900 a população brasileira era de 17.318.556 habitantes e os cinco estados mais populosos, que representavam 60% da população total, eram:
·        Minas Gerais                3.594.471 habitantes
·        São Paulo                     2.282.279 habitantes
·        Bahia                            2.117.956 habitantes
·        Pernambuco                 1.178.150 habitantes
·        Rio Grande do Sul        1.149.070 habitantes

As cinco cidades mais populosas eram:
·        Rio de Janeiro                691.565 habitantes
·        São Paulo                       239.820 habitantes
·        Salvador                         205.813 habitantes
·        Belém                             166.121 habitantes
·        Recife                             113.106 habitantes


Em 1910 a população brasileira era de 23.414.177 habitantes e estes eram os cinco estados mais populosos. Comparando com o quadro de 1900, Pernambuco e Rio Grande do Sul trocaram de lugar na lista:
·        Minas Gerais                4.479.689 habitantes
·        São Paulo                     3.455.030 habitantes
·        Bahia                            2.631.989 habitantes
·        Rio Grande do Sul        1.594.439 habitantes
·        Pernambuco                 1.570.183 habitantes

Na década entraram no Brasil 640.577 imigrantes, sendo as principais origens as seguintes:
·        Itália                                       215.886 pessoas
·        Portugal                                 187.236 pessoas
·        Espanha                                 129.404 pessoas
·        Alemanha                                 17.553 pessoas
·        Japão                                         1.809 pessoas
·        Outros                                      88.689 pessoas

Pecuária e Agricultura


Na virada do século, a população brasileira era de 17,3 milhões de habitantes, vivendo cerca de 11 milhões no campo, Fora os abonados cafeicultores (que moravam nas grandes cidades em ricas mansões e palacetes) a população rural na maioria das vezes, praticava agricultura de subsistência e criação de gado. O rebanho bovino era estimado em 22,8 milhões de cabeça, produzindo 350.000 toneladas de carne por ano. O consumo de carne bovina per capita era de 20 kg por ano. O preço por arroba de boi era de US$2,75. Cerca de 70% do rebanho estava concentrado em Minas Gerais, São Paulo, Rio Grande do Sul e Bahia.

Excetuando algumas regiões do Rio Grande do Sul, onde já existia alguma especialização, em todas as outras regiões de maior rebanho, a criação de gado era uma atividade mista. Criavam-se vacas para a produção de leite e os machos eram engordados para a produção de carne. Também era importante a criação de bois carreiros para tração de arados, carros, carroças e das moendas dos engenhos. Cada propriedade rural tinha no mínimo quatro juntas e outras quatro sendo treinadas para substituí-los.

Devido ao manejo inadequado, insuficiência de sais minerais, falta de vacinação e infestação de vermes, bernes e carrapatos, o crescimento do rebanho  era muito pequeno e mal atingia a taxa de 1% ao ano. A mortalidade de bezerros antes da desmama era preocupante, assim como de animais adultos debilitados  pela falta de pastagens  e acometidos de doenças inerentes desta situação.

Não havia abatedouros organizados e o abastecimento de carne ainda era feito como nos tempos coloniais. Geralmente nos finais de semana os açougueiros abatiam algumas reses adquiridas de criadores locais e revendia a sua carne para a população, geralmente nos sábados. Havia apenas dois tipos de carne: todos os cortes do traseiro eram  chamados de “carne de primeira’ e todos os cortes do dianteiro eram chamados ‘carne de segunda’. Cada fazenda abatia seus garrotes para consumo da casa do fazendeiro e dos agregados. Era hábito  comer carne bovina, apenas nos finais de semana.

Em 1906, a Câmara de Deputados autorizou a concessão de uma verba para ressarcir as despesas de importação de animais de raças puras europeias para melhorar o rebanho nacional. Também foi destinada outra verba para combate às epizootias. O decreto nº  6454 no dia 18 de abril de 1907 concedia outras isenções tributárias aos importadores de animais de raça. Pelo mesmo decreto foi instituído na ‘Sociedade Nacional de Agricultura’, um livro de registro genealógico dos animais importados e controlar a sua descendência. No ano de 1909 foram importados, gozando destes benefícios, cerca de 700 animais.

Foi iniciada pelo governo federal, a instalação de fazendas experimentais de criação de gado. A primeira foi a de Ponta Grossa no Paraná, numa área de 5.600 hectares, doadas pelo estado e que fazia parte anteriormente do posto zootécnico estadual. Existia nela  3 garanhões árabes puro sangue, 1 touro e 14 vacas Caracu, 84 éguas de raças diversas, 12 carneiros Southdown, 45 carneiros Oxforddown e 15 carneiros Romney Marsh.

O Brasil dominava o mercado mundial de café. Na safra 1899/1900 foram colhidas 9.561.445 sacas de 60 kg (573.687 toneladas), na safra seguinte 1900/1901 alcançou 11.373.371 sacas (682.398 toneladas) e na de 1901/1902 o recorde de 16.270.678 sacas (976.241 toneladas).  Entre 1901 e 1910 foram exportadas 130.599.000 sacas no valor médio de 187 libras esterlinas por saca, média de 13.060.000 sacas por ano.


Em 1906 estourou a primeira crise do café. A safra brasileira de 20 milhões de sacas superava o consumo mundial estimado em 16 milhões de sacas. Os preços despencaram fazendo que os governadores de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais se reunissem em Taubaté para buscar uma solução. Foram fixados no convênio assinado os seguintes pontos principais:
·        Preço mínimo para a saca de café.
·        Realizar um empréstimo no exterior de 15 milhões de libras esterlinas para os três estados adquirissem para retirar do mercado o excesso de café.
·        Estabelecer um fundo para a estabilização da taxa cambial para evitar que o mil-réis fosse valorizado.
·        Proibir o surgimento de novas lavouras de café.

Em 1909 já surgiram os primeiros efeitos do convênio e os preços internacionais do café começaram a reagir e o taxa cambial era mantida artificialmente baixa pelo governo. O Brasil endividou-se  e os banqueiros europeus monopolizaram o comércio do café. Muitos fazendeiros quebraram e venderam suas terras para os bancos e as casas comissárias, que foram os grandes beneficiários da situação, comprando quando o preço estava caindo e vendendo na alta.  A dívida externa que entre 1901 e 1906 estava numa média de 340 milhões de dólares, saltou para 444 milhões em 1907, 542 milhões em 1908, 553 milhões em 1909 e 625 milhões em 1910.

Comércio Exterior



Na década houve um superávit acumulado de 978,6 milhões de dólares, o equivalente a 3,5 anos da importação anual média.

Exportações (FOB), Importações (FOB) e Balança Comercial: 1901-1910
     (US$ milhões)
Ano
                      Exportações (FOB)
                     Importações (FOB)
                Saldo   Comercial
1901
197,8
89,4
108,4
1902
176,9
97,2
79,7
1903
179,3
101,6
77,7
1904
191,5
108,9
82,6
1905
216,8
125,9
90,9
1906
258,1
139,0
119,1
1907
263,4
169,6
93,8
1908
214,8
148,7
66,1
1909
309,6
155,5
154,1
1910
307,3
201,1
106,2

Os produtos exportados entre 1901 e 1910 eram:
·        Café                                       51,3%
·        Borracha                                28,2%
·        Couros e peles                         4,3%
·        Erva Mate                                2,9%
·        Cacau                                      2,8%
·        Fumo                                       2,4%
·        Algodão                                   2,1%
·        Açúcar                                     1,2%
·        Outros itens                              7,6%

Os mais importantes parceiros comerciais eram:

Intercâmbio Comercial em Milhares de Libras Esterlinas

Exportação
Importação
Saldo
Estados Unidos
18.660
3.821
+ 14.839
Grã Bretanha
8.190
9.056
-       866
Alemanha
7.248
4.468
+   2.780
França
4.519
2.903
+    1.616
Holanda
1.921
190
+    1.731
Bélgica
1.149
1.190
-         41

O Brasil importou na década 2.154.000 toneladas de trigo em grão.

Moeda Circulante

Na década, a moeda em circulação representou uma média de 721 milhares de contos de réis, estando 44 milhares no caixa das autoridades monetárias, 113 milhares em depósitos nos bancos comerciais e 564 milhares de contos de réis estavam em poder do público.

Produto Interno Bruto

Na década o PIB per capita brasileiro ficou na média de U$ 275 por ano

Ano
População
PIB per capita
Residentes
Variação      (%)
Em reais de 1999
Em dólares de 2000
Variação (%)
1901
17.801.245
516
282
1902
18.328.754
3,0
499
272
-3,35
1903
18.896.826
3,1
493
269
-1,12
1904
19.501.205
3,2
485
265
-1,71
1905
20.137.634
3,3
485
265
0,02
1906
20.801.857
3,3
529
289
9,13
1907
21.489.616
3,3
516
282
-2,42
1908
22.196.656
3,3
484
264
-6,28
1909
22.918.720
3,3
517
282
6,85
1910
23.651.551
3,2
514
281
-0,56

Turbina da Usina de Santana de Parnaíba
Energia

Carvão Mineral. O país consumia uma média anual de 1.149 mil toneladas, que era todo importado. O recorde foi em 1910 quando foram importadas 1.582 mil toneladas.

Derivados de Petróleo. Até 1906 o Brasil só importava querosene de iluminação, uma média de 79 mil m³. De 1907 a 1910 a média foi de 140 mil m³. Em 1907 começou a importação de gasolina. Entre 1907 e 1910 foi importada uma média anual de 2.680 m³.

Energia Elétrica. Em 1900 as usinas instaladas no Brasil geravam 10 MW de energia elétrica. Metade era gerada por usinas hidráulicas e metade por usinas térmicas movidas a carvão. Em 1905 subiu para 45 MW o potencial instalado, sendo 38 MW gerados por hidráulicas e sete MW por térmicas. No final da década estavam instalados 157 MW sendo 124 MW por hidráulicas e 33 MW por térmicas.

Indústria

 Em 1907 existiam 3.328 estabelecimentos fabris que empregavam 152.000 operários e produziam o equivalente a 741.536 contos de réis. Um terço das fábricas localizava-se na cidade do Rio de Janeiro, 16% no estado de São Paulo e 15% no estado do Rio Grande do Sul.  As dez atividades com maior quantidade de estabelecimentos eram:
·        Usinas de açúcar               199 unidades
·        Serrarias e carpintarias      197 unidades
·        Cerveja                             186 unidades
·        Cerâmicas                         179 unidades
·        Fundição de metais            169 unidades
·        Tecelagem de algodão       161 unidades
·        Bebidas                             145 unidades
·        Laticínios                           138 unidades
·        Calçados                           119 unidades
·        Curtumes                           108 unidades

Como curiosidade existia 18 fábricas de tamancos, 11 fábricas de espartilho, nove fábricas de luvas, quatro fábricas de barricas, três fábricas de pentes de chifre, duas fábricas de formicida e uma fábrica de lamparina.

Transportes

Em 1908 o país possuía 16.781 quilômetros de estradas de ferro. 24% em São Paulo, 23% em Minas Gerais, 14% no Rio de Janeiro, 11% no Rio Grande do Sul e 8% na Bahia.

Automóveis


O primeiro automóvel que chegou ao Brasil desembarcou em Salvador da Bahia em 1891 e foi importado por Francisco Pereira Rocha. Era movido a vapor e provocou grande alvoroço na cidade.

O primeiro automóvel movido a motor à explosão chegou a Santos (SP) em 1893, importado pela família de Alberto Santos Dumont, o inventor do avião. Era um Peugeot francês. Henrique, o irmão mais velho de Alberto era quem dirigia o veículo. Em 1903 existiam seis automóveis em São Paulo e em 1904 já existiam 83 unidades. Não se sabe como  conseguiam combustível para mover os veículos, pois, só a partir de 1907 a gasolina começou a ser oficialmente importada.

Telefones

O telefone foi patenteado nos Estados Unidos em 1876 por Alexander Graham Bell e no mesmo ano, na Exposição em Filadélfia comemorativa do centenário da independência do país, o imperador D. Pedro II tomou conhecimento dele.  No ano seguinte recebeu de presente do inventor um par de telefones que foram instalados no Palácio de São Cristóvão e no centro da cidade. Em 1883 foi instalada em Santos (SP) a primeira central telefônica do Brasil e no final do mesmo ano já existiam cinco centrais telefônicas no Rio de Janeiro com capacidade para mil ramais. Em 1884 foram instalados em São Paulo os primeiros aparelhos.

Em 1907 existiam 15.208 telefones em todo o Brasil: sendo 5.399 no estado de São Paulo, 3.365 no Rio de Janeiro e 2.815 no Rio Grande do Sul, ou seja, 76% do total.


Cultura e Entretenimento

O Brasil vivia em plena ‘Belle Epoque’. A Belle Époque no Brasil abrangeu o período entre 1889, (data da proclamação da República), e 1922, ano da realização da Semana da Arte Moderna em São Paulo. Foi uma época de florescimento total do belo, de transformações. Surgem novas descobertas e tecnologias, e o cenário cultural fervilha. A face artística é marcada pelo nascimento do Impressionismo e da Art Nouveau.

Em 1900 Machado de Assis lançou o livro ‘Dom Casmurro’ e Joaquim Nabuco sua autobiografia ‘Minha Formação’. E começou a circular a ‘Revista da Semana’

Chiquinha Gonzaga compõe a marchinha carnavalesca ‘Ô Abre Alas’

Em 1901 Afonso Celso publicou o seu livro ‘Por que me Ufano de Meu País’ e Silvio Romero os ‘Ensaios de Sociologia e Literatura’.

O proprietário da Casa Edison do Rio de Janeiro introduziu o disco fonográfico no Brasil, gravando modinhas e lundus. com a voz do desconhecido Eduardo das Neves. Para ouvir o disco os interessados tinham que comprar um gramofone que custava 700 mil réis, o equivalente a dois meses de salário de um comerciário

Em 1902 começou a circular a revista ‘O Malho’ e Euclides da Cunha publicou ‘Os Sertões’.

Em 1903 Sarah Bernhardt em sua terceira visita ao Brasil se apresentou no Teatro Polytheama em São Paulo com grande sucesso.

Em 1904 o prefeito Pereira Passos iniciou a remodelação urbana do Rio de Janeiro, demolindo casebres para abrir novas avenidas no estilo europeu

Em 1905 apareceu o ‘Tico Tico’ a primeira revista em quadrinhos do Brasil e Olavo Bilac publica o seu ‘Tratado de Versificação’.

Em 1906 a atriz de teatro de revista Maria Lino lançou para o carnaval o maxixe ‘Vem Cá, Mulata’ composto por Arquimedes de Oliveira e Bastos Tigre, que causou rebuliço, pois o maxixe era considerado uma dança obscena.

Em 1907, no dia 15 de junho realizou-se em Haia na Holanda a ‘Segunda Conferência Internacional pela Paz’, onde se destacou Rui Barbosa como o Águia de Haia.
Também foi lançada em 1907 a revista ‘Fon-Fon’.

Em 1908 foi lançado o filme de Antonio Leal ‘Os Estranguladores’. Antonio Leal ao lado de Alberto e Paulinho Botelho foi um dos pioneiros do cinema nacional.

Em 1909 foi inaugurado o Teatro Municipal do Rio de Janeiro.

Carlos Chagas  descobriu que a doença que ficou conhecida como ‘Mal de Chagas’ era causada por um micróbio transmitido pelo barbeiro, um inseto sugador.

Em 1910 era criado o Serviço de Proteção aos Índios (SPI) sob direção de Candido Rondon.
William Auler produziu o filme ‘Paz e Amor’, dirigido por Alberto Botelho.
         

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